As razões são desconhecidas e só estudos mais aprofundados podem confirmar e explicar os porquês, mas Humberto Jorge acredita que o facto de existirem cada vez mais pequenos peixes (carapaus, cavala ou sardinha) atrai um número crescente de grandes animais marinhos de maior porte, fazendo com que "se aproximem da costa, ficando mais tempo por aqui, algo que se tem visto, inclusive, nos estuários dos grandes rios, nomeadamente no Tejo".
Além da comida em abundância, a qualidade da água também tem melhorado, o que, na opinião dos pescadores, é uma forte ajuda.
Toninhas e atuns
Ricardo Santos, pescador e dirigente da Cooperativa de Pesca de Setúbal, Sesimbra e Sines, confirma o grande aumento de sardinha na costa nacional, em que se encontram cada vez mais golfinhos, sobretudos as chamadas toninhas, que acompanham os barcos durante a pesca.
Além disso, nos últimos 30 anos nunca tinha ouvido falar da presença de orcas em zonas próximas de terra, com relatos de barcos danificados no último ano.
Contudo, não são só os relatos de golfinhos, orcas e baleias que se ouvem entre quem anda no mar. "A par disso temos constatado algo que nunca tínhamos visto nos últimos 25-30 anos: atuns com 200 a 300 quilos que têm aparecido, talvez, também, pela maior quantidade de sardinha", refere Ricardo Santos.
Sem peixe de um dia para o outro
Há cerca de mês e meio, uma traineira desta cooperativa apanhou, sem intenção, mais de 15 destes grandes atuns-rabilhos espécie proibida de ser pescada.
Os atuns acabaram por destruir as redes de pesca, num episódio que já se repetiu quatro ou cinco vezes só este ano, em casos confirmados por Manuel Cardoso, pescador em Sesimbra, que sublinha os "grandes prejuízos" nas redes de pesca, que acabam por ser destruídas, além das dezenas de avistamentos de orcas, na zona, só este ano.
"Aliás, há noites em que encontramos muita sardinha e no dia seguinte o mar já tem pouca, algo que explicamos pela existência dos tais grandes predadores que vêm à procura da sardinha na nossa costa, a uma ou duas milhas de terra", adianta Ricardo Santos, que relata igualmente as capturas, cada vez mais frequentes, dos tubarões de profundidade como lixas ou cações.
Mais animais ou mais avistamentos?
Tiago Sá, biólogo marinho que todos os dias vai para o mar do Algarve em passeios turísticos, confirma que também a Sul encontram cada vez mais golfinhos, baleias e orcas, mas admite que ainda é incerta a razão para o aumento dos avistamentos que se podem dever a um crescimento do número de barcos de lazer à procura destes animais.
"Estamos a ver animais com mais frequência. Contudo, como na área do turismo o número de embarcações cresceu muito na última década, é expectável que existam cada vez mais avistamentos, pois comunicamos uns com os outros", explica.
"Quando comecei a trabalhar, em 2009, havia dias, em pleno verão, em que não observávamos qualquer espécie de golfinho, baleia ou cetáceo. Neste momento, é o oposto, ou seja, é raro o dia em que isso não acontece", afirma Tiago Sá, que admite que não pode ter a certeza se há mesmo mais animais deste tipo no mar português.
Jorge Gonçalves, biólogo marinho, doutorado em Ecologia das Pescas, afirma que não há evidências científicas sobre a causa da aproximação destes cetáceos da costa. Contudo, o professor da Universidade do Algarve acredita que o fenómeno pode mesmo explicar-se por haver mais alimento no mar.
"Pode estar ligado ao facto de termos a pesca da sardinha fechada quase metade do ano nos últimos 10 anos", admite.
Se assim for, se o stock tiver recuperado, "são muito boas notícias".
Na opinião do biólogo, porém, o avistamento de mais orcas, golfinhos e até atuns-rabilho ao largo da costa continental explica-se também pelo aumento exponencial de empresas marítimo-turísticas que fazem o avistamento de cetáceos".
Quanto ao facto de os atuns-rabilho aparecerem nas redes dos pescadores e estes não os poderem capturar, Jorge Gonçalves lembra que Portugal tem uma quota muito pequena, atribuída anualmente pela Comissão Europeia, para pescar esta espécie. O ano passado foi de cerca de 575 toneladas. Daí que esta espécie esteja interdita aos pescadores.
"Com as armações de atum existentes no Algarve rapidamente esgotamos a quota e, às vezes, (nas próprias armações) até têm que os libertar", conta.