A terra é alcançada por luz solar suficiente para satisfazer todas as suas necessidades energéticas, oferecendo a promessa de combustível barato para alimentar veículos, máquinas e indústrias pesadas.
Uma equipa de investigação liderada pela Universidade de Tóquio ganhou este mês um prémio da União Europeia no valor de cinco milhões de euros, por ter encontrado uma forma inovadora de fazer combustível abundante e barato a partir da luz solar.
Na corrida para encontrar alternativas aos combustíveis fósseis, o concurso da UE visava acelerar o desenvolvimento de uma das mais promissoras novas tecnologias a fotossíntese artificial num espírito de promoção da colaboração internacional sobre os caminhos mais promissores da energia limpa.
Grande potencial
A tecnologia imita a fotossíntese natural em que as plantas utilizam os raios solares para transformar a água em oxigénio e o dióxido de carbono em energia química sob a forma de glicose. A fotossíntese artificial utiliza a luz solar para dividir a água em oxigénio e hidrogénio. O oxigénio é libertado para a atmosfera e o hidrogénio pode ser utilizado como combustível.
"A fotossíntese artificial tem o potencial de fornecer uma enorme quantidade de combustível verde", diz Kazunari Domen, coordenador da equipa vencedora, numa entrevista após a Comissão Europeia ter anunciado o prémio a 5 de dezembro em Bruxelas.
Composta por cientistas da Universidade de Tóquio e da empresa energética japonesa INPEX, a equipa estava entre os 22 candidatos ao prémio Combustível do Sol e chegou a uma shortlist de três finalistas, antes de emergir vitoriosa. Os dois vice-campeões eram de França e da Grã-Bretanha. O concurso teve lugar no âmbito de uma iniciativa global chamada Missão Inovação, que reúne 24 países e está a estimular atividades de investigação e investimentos numa tentativa de tornar a energia limpa universalmente acessível e acessível.
"O prémio foi atribuído à equipa vencedora pelo elevado grau de engenharia e integração profissional", disse a Comissão.
Se a fotossíntese artificial for suficientemente barata, poderá substituir o petróleo, o gás natural e o carvão para todo o tipo de veículos, máquinas e indústrias, incluindo químicos que não podem ser alimentados apenas com eletricidade renovável. Embora a luz solar seja abundante e livre, muitos dos métodos para a converter em combustível são demasiado caros ou demasiado difíceis de escalar para competir com os combustíveis fósseis.
Ensaio de motor
O protótipo dos vencedores tem potencial para ser ao mesmo tempo barato e facilmente escalável.
Os concorrentes tiveram de desenvolver um dispositivo que utilizava a fotossíntese artificial para criar combustível suficiente para alimentar um pequeno motor. Os dispositivos foram postos em funcionamento ao ar livre e testados quanto à quantidade de combustível que produziram, à sua composição e à sua capacidade de alimentar o motor.
O sistema vencedor utilizou fotocatalisadores em contacto com água pura.
Os fotocatalisadores são partículas ultrafinas que absorvem a energia do sol e espoletam a divisão da água. O hidrogénio resultante foi então combinado com dióxido de carbono para produzir metano, que foi utilizado para fazer funcionar o motor.
Porque os fotocatalisadores são uma forma simples de converter a luz solar em energia química, dão a esperança de produzir hidrogénio verde de baixo custo, diz Domen, professor na Universidade de Tóquio e na Universidade de Shinshu.
Hidrogénio verde
O desafio do concurso era construir um protótipo totalmente funcional de um sistema baseado na fotossíntese artificial que pudesse produzir um combustível sintético utilizável. "O nosso projeto tem até agora visado a produção de hidrogénio, mas graças a este concurso adquirimos conhecimentos importantes sobre a síntese de combustíveis verdes como o metano, que são mais favoráveis ao armazenamento e ao transporte", explica.
"O hidrogénio produzido no sistema vencedor pode ser considerado verde", disse.
Atualmente o hidrogénio verde, fabricado com energias renováveis, incluindo solar e eólica, representa menos de 1% do hidrogénio total produzido, de acordo com a Agência Internacional de Energia. O custo atual da produção de hidrogénio verde é tão elevado que a atividade não é rentável sem apoio governamental. A prioridade da sua equipa agora é encontrar um fotocatalisador mais eficaz.
O dispositivo vencedor alcançou cerca de 0,6% de eficiência, o que significa que cerca de 99% da energia foi perdida. Para tornar tal combustível comercialmente viável, o catalisador terá de fornecer pelo menos 5% de eficiência. "Já encontrámos vários materiais candidatos que podem proporcionar uma eficiência de 5% ou mesmo 10%», anunciou Domen. "Por isso acredito que podemos fazer isso num futuro próximo".
Obstáculos ao mercado
"Se for bem-sucedida, a equipa deverá ser capaz de ultrapassar as restantes barreiras à comercialização dentro de anos, em vez de décadas, em colaboração com parceiros da indústria". Um obstáculo que. Domen está confiante de eliminar é regulamentar.
Apesar de a combinação de hidrogénio e oxigénio ser "explosiva", "sabemos como manusear a mistura em segurança".Outro obstáculo é o desenvolvimento de reatores baratos e a melhoria da separação do hidrogénio da mistura.
Se forem bem-sucedidas, as unidades de produção final serão compostas por recipientes muito finos de água e fotocatalisadores, expostos à luz solar.
Cerca de 10 mil unidades, cada uma com 25 quilómetros quadrados, teriam de ser construídas até 2050 para satisfazer um terço das necessidades energéticas mundiais, de acordo com o o professor universitário.
Perspetivas de lucro
"Muitas pessoas da indústria disseram-me que se podem ganhar dinheiro, por isso 10 mil fábricas não é impossível", afirmou. "Depende realmente de poderem ou não ganhar dinheiro". Entretanto, enquanto a sua equipa corre para encontrar um fotocatalisador mais eficaz, Domen diz que o prémio Combustível do Sol ajudará a transformar os céticos do método em defensores do mesmo.
"A maioria das pessoas não acredita que os fotocatalisadores funcionariam", disse.
Este artigo foi originalmente publicado na Horizon, a Revista de Investigação e Inovação da UE.