O padre suspeito de ter usado dinheiro de esmolas e das contas bancárias de duas paróquias na Grande Lisboa para comprar, entre outros bens, 19 carros foi condenado, esta quinta-feira, a quatro anos e meio de prisão com pena suspensa e a pagar várias indemnizações por um crime de abuso de confiança de forma agravada e de furto qualificado.
O padre António Teixeira foi esta quinta-feira condenado em tribunal por ter desviado arte sacra e esmolas da diocese de Santo Condestável, em Lisboa, para comprar carros e custear outras despesas pessoais. O arguido estava acusado pela prática de quatro crimes: um de furto qualificado, dois crimes de abuso de confiança e um de branqueamento de capitais. Foi absolvido de dois: um crime de abuso de confiança agravado respeitante à Paróquia dos Remédios de Carcavelos e de branqueamento de capitais.
Imagens de Santa Luzia, Nossa Senhora da Conceição e do menino Jesus, castiçais, salvas de prata, cálice cerimonial adornado com safiras, rubis e esmeraldas, entre outras imagens do séc. XVII estão entre as mais de 20 peças da igreja da paróquia do Santo Condestável, que António Teixeira vendeu a antiquários sem o conhecimento da diocese. O tribunal considerou que "não há qualquer dúvida que as peças de arte sacra não pertenciam ao padre, mas à paróquia de Santo Condestável", tendo condenado o arguido pela prática deste crime. "O motivo para a venda das imagens religiosas não tinha qualquer justificação na medida em que as contas das paróquias se mostravam suficientes para garantir as obras", explicou o juiz Paulo Registo.
O arguido foi ainda condenado pelo crime de abuso de confiança na forma agravada por ter feito chegar centenas de milhares de euros à sua esfera particular através de transferências bancárias com origem nas contas das fábricas das duas igrejas, por um lado, e de depósitos nas suas contas pessoais de esmolas dos fiéis, por outro. O tribunal "não encontrou justificação" para o arguido manter 20 000 euros na sua conta, nem para efetuar transferências de "30 000, 15 000, 22 000 e 25 000 euros". "O tribunal considerou que houve uma apropriação do padre destes montantes".
O padre viu ainda ser-lhe decretado o pagamento de indemnizações à igreja e aos comerciantes de antiguidades, no valor de 178 955 euros. A maior indemnização, à Fábrica da Igreja Paroquial de Santo Condestável, tem o valor de 112 965 euros.
O tribunal considerou a acusação de branqueamento de capitais "improcedente ou não provada" e absolveu o arguido da prática deste crime. O coletivo de juízes entendeu que a compra dos 19 automóveis não configurou lavagem de dinheiro.
"De acordo com a versão da acusação, a dissimulação do dinheiro prendia-se com a transferência do dinheiro de umas contas para outras contas e a aquisição dos veículos automóveis. O tribunal não efetuou a mesma leitura dos factos que foi efetuada pelo Ministério Público, ou seja, não considerou que houvesse intenção de esconder ou dissimular ou branquear o dinheiro", disse o juiz Paulo Registo na leitura da sentença.
O padre foi ainda absolvido de um crime de abuso de confiança agravado respeitante à Paróquia dos Remédios de Carcavelos. O tribunal deu como provada a transferência das contas do arguido para as contas da paróquia e desta para a conta do arguido. O tribunal considera que "esta não é uma atuação regular e há necessidade de evitar transferências de umas contas para as outras", mas não conseguiu provar que o arguido se apoderou das quantias mencionadas na acusação.
Entre 2011 e 2017
O juiz admitiu que "o tribunal teve em conta o percurso de vida e a conduta muito ativa e assertiva do arguido no sentido de resolver muitos problemas da paróquia, que afligem os paroquianos, quer em atos de cariz mais social, como o apoio a toxicodependentes e a prostitutas".
Segundo a acusação do Ministério Público (MP), os atos terão sido praticados entre 2011 e 2017, período em que António Teixeira administrou as paróquias de Nossa Senhora dos Remédios, em Carcavelos, Cascais (julho de 2011 a julho de 2015) e do Santo Condestável, em Campo de Ourique, Lisboa (outubro de 2015 a janeiro 2017).
Em ambas, o padre terá, alegadamente, feito chegar centenas de milhares de euros à sua esfera particular, de duas formas: através de transferências bancárias com origem nas contas das fábricas das duas igrejas, por um lado, e de depósitos nas suas contas pessoais de esmolas dos fiéis, por outro. Neste caso, estarão em causa donativos em numerário no valor de 160 850 euros em Carcavelos e de 26 500 euros em Campo de Ourique.
No total, o sacerdote terá desviado quase 420 mil euros, cuja origem terá depois tentado esconder com a compra de 19 carros, de 2011 a 2017. Entre estes, estão 12 Volkswagen e três Mercedes. A quantia terá ainda sido gasta em "despesas genéricas": compras de supermercado, roupa, refeições, seguros, portagens, carregamentos de telemóvel e serviços de televisão e Internet.
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