Foi uma das novidades da reunião desta terça-feira no Infarmed que surpreendeu os próprios especialistas do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA): o crescimento de uma variante do SARS-CoV-2 com semelhanças àquela que ficou conhecida como a variante da Califórnia.
O epidemiologista do INSA, João Paulo Gomes, adiantou mesmo que é algo "surpreendente" de que "não estávamos à espera".
Em causa uma variante que não é a mesma que a da Califórnia, mas que partilha uma mesma mutação identificada como L452R, que, pelo menos num estudo experimental, já revelou que pode significar uma menor resistência aos anticorpos" daí a preocupação acrescida" com os números detetados em Portugal.
Entre 10 e 19 de janeiro, na última avaliação da diversidade genética das variantes feita pelo INSA, 6,8% das infeções estudadas tinham a mutação anterior, incomparavelmente acima de outras duas variantes de que muito se fala - da África do Sul e do Brasil, ficando apenas abaixo da variante do Reino Unido que chega a 16% dos casos. O INSA promete estar "atento".
João Paulo Gomes referiu que, na avaliação anterior, em novembro, tinham sido encontrados apenas dois ou três casos associados à mutação idêntica à da Califórnia e que agora os 6,8% significam que a mutação está "espalhada" por 32 concelhos.
O mapa elaborado pelo INSA, consultado pela TSF, revela que a mutação surge maioritariamente na região de Lisboa e Vale do Tejo.
Os motivos para ficar preocupado
O presidente da Sociedade Portuguesa de Virologia, Paulo Paixão, explica que é normal que, tendo em conta as inúmeras mutações que se sabe que podem existir nos coronavírus, haja resultados semelhantes em diferentes pontos do mundo, mutações que, mesmo sem ter origem no mesmo local geográfico, acabam por ter um resultado semelhante ou quase igual.
Neste caso, tudo indica que foi isso que aconteceu com esta variante detetada em Portugal que tem uma mutação idêntica à da Califórnia, que se disseminou na costa Oeste dos EUA com vários surtos de grande dimensão.
A mutação L452R "confere uma maior adesão do vírus às células que infeta", gerando o que aparenta ser uma maior transmissibilidade. No entanto, o principal problema não será esse acréscimo de transmissibilidade que também existe, por exemplo, na variante do Reino Unido.
"O principal problema da variante da Califórnia que não existe na variante do Reino Unido, é que esta mutação leva a uma alteração da conformação da proteína que faz com que seja mais resistente aos anticorpos", à semelhança do que acontece com a variante da África do Sul, que até agora apenas teve casos pontuais em Portugal.
Atenção ao que se passa nos EUA
De acordo com Paulo Paixão, "(perante esta variante) poderá existir embora isso ainda não esteja totalmente demonstrado, uma menor proteção quando recebemos a vacina ou se já tivermos estado infetados". Razões que levam o presidente da Sociedade Portuguesa de Virologia a partilhar da preocupação dos especialistas do INSA, admitindo que "esta mutação é, de alguma forma, mais preocupante do que outras que já foram detetadas em Portugal".
O especialista sublinha que agora é importante aguardar pelos dados norte-americanos e pelos resultados das vacinações que estão a decorrer, em massa, na Califórnia, com o objetivo de perceber se as vacinas perdem eficácia perante uma mutação idêntica à que afeta a variante que surge em 6,8% dos casos sequenciados pelo INSA em Portugal.
Por outro lado, ao nível da reinfecção com a Covid-19, à semelhança da variante de Manaus (Brasil), a variante californiana e a mutação encontrada em Portugal também pode fazer com que as infeções sejam mais frequentes, tendo em conta que os tempos de imunidade gerados pela doença se arriscam a ser mais curtos.
Sem comentários:
Enviar um comentário